A cultura afro-brasileira nas redes sociais: entre ditos, amarrações e encruzilhadas 

três mulherrs negras estão sorrindo e vestidas com roupas coloridas em frente a um muro cheio de pinturas que representam a cultura afro-brasileira.

A cultura afro-brasileira está cada vez mais presente nas redes: os terreiros estão no TikTok, no Instagram e em outras plataformas! No TikTok, a pesquisa por #umbanda e #candomblé, por exemplo, oferece milhares de vídeos de médiuns incorporados com Maria Navalha e Exu; receitas de oferenda e; saídas de Santo nos barracões. 

No Instagram, a presença de influenciadores de Candomblés, Umbandas e Quimbandas, aponta para a digitalização das religiões afro-brasileiras. Mas, também traz desafios relacionados ao esvaziamento e à comercialização das práticas negras-espirituais em um ambiente refém da lógica algorítmica e capitalista. 

Em paralelo, lideranças de terreiro, como Mães e Pais de Santo, vêm construindo canais de educação ancestral. Através de seus perfis nas plataformas, eles circulam diversos conhecimentos sobre a cultura afro-brasileira, incluindo histórias, mitos, medicinas e ações políticas do povo de terreiro em território brasileiro. 

Assim, embora as redes sociais sejam um canal de visibilidade importante as Comunidades de Terreiro disputarem espaço e narrativas, pensar estratégias de autopreservação e autocuidado para essas populações no universo virtual também é necessário

Dos influenciadores digitais de axé às lideranças de terreiro

Os criadores de conteúdo das tradições afro-religiosas, popularmente conhecidos como “macumbeiros do Instagram’’ e “macumbeiros do TikTok” tem ganhado cada vez mais alcance e reconhecimento no espaço digital. 

Atualmente, eles estão à frente de iniciativas, como: venda de cursos online de desenvolvimento mediúnico, workshops sobre Pombagira, masterclass sobre ervas sagradas, lives de jogos de búzios e e-books de “umbanda livre’’. 

Enquanto eles seguem com a exposição e a comercialização de saberes terreiros, transformando ritos e Entidades em simples espetáculos para monetizar nas mídias digitais, os princípios de segredo e vivência comunitária das tradições religiosas negras vem sendo desafiados

Porém, em outra estrada, acompanhamos a presença de matriarcas e patriarcas dos terreiros nas redes sociais. 

No perfil do Instagram da Cida de Oxalá, Ẹ̀gbọ́mi do Terreiro de Candomblé Ilê Axé Opô Aganjú, encontramos debates sobre racismo religioso, por exemplo. Em 21 de março, Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, ela convoca sua comunidade digital a exercer o respeito pelos Orixás e pelas crenças negro africanas. Em outra publicação, a matriarca conta a história de uma lenda sobre Oxalá e Nanã Buruquê, sob o olhar atento de algumas crianças e adultos, em sua casa de santo.

Na mesma banda, o Babalorixá Sidney Nogueira, traz o post “Coisas que você deve saber para ingressar em um terreiro de Candomblé’’ para explicar aos seguidores que o Sagrado preto possui fundamentos raciais, linguísticos, políticos e mitológicos que devem ser respeitados.

Em outros perfis dessas autoridades religiosas, acompanhamos reels sobre itãs dos Orixás, provérbios africanos e a diferença entre as manifestações de religiões afro-brasileiras, como Tambor de Mina, Batuque, Vodum e Jurema, por exemplo. 

A cultura digital não está imune às violências 

Tarcízio Silva, pesquisador em políticas tecnológicas, alerta que as violências, disputas e opressões de raça, classe, gênero e suas interseccionalidades também acontecem no digital.

Na prática, isso significa que os discursos racistas e as manifestações de racismo religioso, por exemplo, não apenas estão presentes nesses espaços, como também são reatualizados por meio de novos agentes e recursos dessas plataformas. 

Um exemplo desses casos, que atingem diretamente a cultura afro-brasileira e são protagonizados por gente de terreiro são os vídeos de react. Esses conteúdos virais, agora, funcionam como “tribunais’’ onde os influenciadores de axé comentam e classificam sobre ritos, médiuns, entidades e terreiros alheios, julgando eles como “marmotas’’.

Não coincidentemente, enquanto eles reagem aos materiais indicando o certo x errado, tradicional x moderno, fundamento x criação numa performance de “militância macumbeira”, há um silêncio sobre parte significativa destes vídeos envolver grupos marginalizados, como pessoas pretas, periféricas e LGBTQIAPN+.

Ocupar o digital sem perder a raiz, a ética e o axé

Admiro profundamente a visão que a escritora Audre Lorde tem sobre medo, silêncio, linguagem, vulnerabilidade e ação. Ela diz no livro Irmã Outsider: “essa vulnerabilidade que nos torna mais vulneráveis e também a fonte de nossa maior força’’ (2020, p. 54). 

Pensando nisso, embora quebrar os silêncios que foram, historicamente, impostos às Comunidades de Terreiro, através desse comunicação digital ou da “digitalização da fé’’, como tem sido chamado, é preciso manter a vigia

Principalmente, porque as conversas sobre as religiões de matriz africanas que acontecem no virtual não dão conta de abarcar de forma integral e genuína as filosofias de terreiro.

Precisamos (continuar a pensar) sobre a necessidade de criação de estratégias e caminhos que fortaleçam as políticas de cuidado com as tradições de terreiro e seus corpos sagrados em meio a essa presença nas redes sociais. 

Como nos disse a Ìyálorisa Omilade, conhecida também como YemoJazz, “Orixá não precisa de marketing, precisa de respeito, vivência e conhecimento. Não é sobre viralizar, é sobre enraizar’’.

Pé na encruzilhada, seguimos refletindo sobre a cultura afro-brasileira e suas expressões nas redes sociais. Voltamos a conversar em breve.

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