Lélia Gonzalez: conheça sua contribuição para o Movimento Negro.

Lélia Gonzalez

Em 2019, a ativista e intelectual estadunidense Angela Davis visitava o Brasil, e foi por meio de uma de suas falas que ela frisou a importância do consumo das obras de Lélia Gonzalez, para compreendermos a questão racial brasileira a partir da nossa própria realidade.

Com isso, podemos dizer que a originalidade e o pioneirismo da escritora mineira ultrapassaram barreiras geográficas, tornando-se referência em contexto mundial. Ela estava ciente de sua capacidade, que alinhada às suas estratégias, conseguiram nortear milhares de outras mulheres negras.

Você já conhece Lélia e a potência de suas obras? Caso ainda não, que tal aprender um pouco sobre o conceito de “pretoguês” pensado e idealizado por ela? Vamos lá?!

Pretoguês: o idioma brasileiro com influência africana!

Ao fazer algumas viagens à África, Lélia Gonzalez notou que a “forma de se falar” no continente muito se igualava ao Brasil. Por já estudar linguística e psicologia social, ela, então, decidiu aprofundar suas pesquisas para entender o fenômeno. Com isso, nasce o conceito de “pretoguês”, que nada mais é do que a marca de africanização no português falado no Brasil.

Visto por algumas pessoas como um “erro linguístico”, o pretoguês é descrito por sua criadora como uma forma de pensar a identidade cultural brasileira, com toda a influência oriunda de idiomas africanos. Ou seja, se resume na resistência dos dialetos de origem Bantu (trazidos ao Brasil por pessoas negras escravizadas no período colonial) que persistem até hoje no cotidiano brasileiro.

Diferente do português escrito, o pretoguês se materializa como a linguagem oral do brasileiro, ou melhor dizendo, a língua realmente falada no dia a dia.

Por conta disso, é comum vermos algumas pessoas verbalizarem as palavras “probrema” ou “framengo” em uma simples conversa, o que não está errado. É importante ressaltar que essas pessoas nunca devem ser vistas como “sem conhecimento” por trazerem mecanismos de linguagens ancestrais, pois quem ridiculariza pessoas que falam o pretoguês mais frequentemente, está praticando o preconceito linguístico.

Como de costume, Lélia Gonzalez, além de rascunhar o conceito, também fez questão de utilizar o pretoguês para escrever suas obras e fazer com que elas se tornassem acessíveis, com o intuito de democratizar o acesso às suas produções acadêmicas.

Mas, falando sobre o que ela nos deixou… Que tal entrarmos em uma imersão nas heranças da mulher responsável por “parir” outras percepções da América Latina, ao enegrecer as narrativas? Vamos lá?!

O legado de Lélia Gonzalez: sua contribuição para a Literatura Afroamericana e para o Movimento Negro brasileiro.

Com os olhos de hoje conseguimos entender o quão à frente do seu tempo era Lélia Gonzalez, pois construiu um legado importantíssimo com suas participações em momentos decisórios no Brasil e no mundo, com estudos sobre candomblé, psicanálise, marxismo, juventude e cultura negra, e entre vários outros assuntos.

Em anos difíceis, a filha de Oxum foi capaz de fundar o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNCUDR, que mais tarde se tornaria MNU), o Instituto de Pesquisa das Culturas Negras (IPCN) e o Coletivo de Mulheres Negras N’zinga. Ela também participou ativamente na construção do Partido dos Trabalhadores (PT), resistiu de forma efetiva à ditadura militar nos anos de 1964-1985 e lutou com outras pessoas negras brasileiras contra o Apartheid na África do Sul.

Para além de tudo isso, a mineira foi uma pessoa fundamental para as formulações de políticas públicas para pessoas negras brasileiras, bem como na idealização de um feminismo afrolatinoamericano (no qual compreende as demandas de mulheres negras e indígenas) e claro, não podemos deixar de citar a importância de sua articulação para a fomentação à cultura, através da criação de blocos-afros, como o Olodum.

Mesmo com todas essas contribuições, ela ainda foi em frente, nos deixando com diversas produções acadêmicas e conceitos utilizados até hoje, como o pretoguês citado anteriormente, e a “amefricanidade”, que diz respeito ao encontro da diáspora negra com os povos originários.

Ufa! Que esta mulher é gigante já deu para perceber, não é mesmo?!

Mas para compreender como ela construiu tudo isso, continue a ler e saiba mais sobre sua vida e algumas de suas obras!

Lélia Gonzalez: sua história e indicação de leituras.

Lélia de Almeida nasceu em Belo Horizonte – Minas Gerais, no dia 1º de fevereiro de 1935, sendo filha de pai negro e mãe indígena. Foi graduada em História e Geografia, e bacharel em Filosofia, ambas pela Universidade Estadual da Guanabara, atual UERJ.

Se você acha que ela parou por aí, se enganou! Ao longo de sua vida, ela ainda atuou como professora universitária, fez mestrado em Comunicação, doutorado em Antropologia, se tornou poliglota, e foi a primeira mulher negra diretora de um Departamento Universitário!

Antes de sua precoce partida, a aquariana nos deixou sua vasta produção intelectual, que hoje são bases sólidas para pensarmos as vivências de mulheres negras.

Aqui na Awalé já falamos sobre ancestralidade e feminismo negro, mas para uma imersão nas produções acadêmicas de Lélia Gonzalez, indicamos as seguintes obras:

  • Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira: O artigo escrito no início da década de 1980 traz relatos reais da autora, e fala sobre como o racismo e o sexismo se tornaram elementos culturais do nosso país, utilizando de conceitos como a “lixeira da sociedade nacional” e a “neurose cultural brasileira”.
  • Por um Feminismo Afro-Latino-Americano: Com organização de Flavia Rios e Marcia Lima, o livro que herdou o nome de um dos artigos de Lélia, traz um compilado com várias de suas obras, perpassando pelas produções feitas de 1979 a 1994.

Como no candomblé, a percussora do feminismo negro deve ser celebrada e reverenciada como uma mais velha, detentora de uma sabedoria inigualável e um ponto de referência fundamental para o Brasil e para o mundo.

Salve Lélia Gonzalez!

Texto por Helena Smith

Bacharela em Serviço Social pela Universidade Federal do Pará, Helena é uma mulher paraense que faz parte da comunidade LGBTQIA+. É encantada desde sempre pela escrita, e pelo poder que ela tem de conectar pessoas! Além disso, também é mãe de pet & plantas, amante do samba e do reggae, entusiasta da cozinha e apaixonada por cafés.

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